Cabaceiras - Paraíba

Localização Distrito da Ribeira, s/n - Zona Rural - Cabaceiras/PB - CEP 5848000
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O Território

O município de Cabaceiras está localizado na Paraíba, há cerca de 180 km de João Pessoa, na região do Cariri Oriental. Localizado no Planalto da Borborema, a região tem clima semiárido, e os biomas principais são a caatinga e a mata atlântica. Por conta do planalto, Cabaceiras se destaca pelo baixo índice pluviométrico anual, sendo o menor do nordeste. Apesar da pouca água e as dificuldades que isso poderia trazer para uma cidade com grande população rural, Cabaceiras se destaca pela qualidade e por ter se tornado polo do artesanato em couro, sendo um dos melhores do Brasil em produção de couro caprino.

O município também ganhou o título de "Roliúde Nordestina" e mantém o "Memorial cinematográfico", que tem como foco preservar, pesquisar, exibir e fomentar o cinema na Paraíba. O filme "O auto da compadecida" foi gravado no centro histórico da cidade.

Ainda em Cabaceiras, vários geossítios atraem os olhares curiosos e atentos às formações geológicas da era mesozoica e pinturas rupestres de cerca de 12 mil anos, atribuídas aos indígenas Cariris que habitavam a região. Entre os geossítios mais visitados estão o Lajedo de Pai Mateus e Saca de Lã.

Entre lajedos, cinematografias e a cultura do couro, a cooperatividade em Cabaceiras parece fazer parte de um sentimento uníssono. O turismo cultural permite que a população local tenha autonomia contando a história do próprio território e trazendo o protagonismo necessário de toda cadeia produtiva do couro. Conhecimento essencial para um consumo consciente, que traz consigo o rosto de quem faz.

Como nasce um polo criativo?

A cultura do couro em Cabaceiras, segundo relatos, já existe há pelo menos 3 gerações, a princípio como atividade secundária a agricultura e a criação de animais. O distrito da Ribeira, na década de 70, era considerado um dos maiores produtores de alho do Brasil. Porém, por ser a cidade com menor índice pluviométrico do Nordeste, o período de chuvas é curto e por vezes não é suficiente para encher barreiros e tanques d'água para manter animais e roçados vivos e alimentados.

E é justo em um momento de estiagem que o couro vira protagonista, curiosamente, no período que poderia ser de maior escassez para toda população. Na década de 80, a atividade do artesanato em couro se intensifica. Com o aumento da instalação de pequenos curtumes nas margens do rio e seu consequente impacto em uma das poucas fontes de água potável da região, a prefeitura municipal de Cabaceiras desenvolveu em 1984 uma proposta de "curtume coletivo". O objetivo era concentrar a atividade em um galpão com alguns maquinários, no distrito da Ribeira.

A princípio houve resistência, mas em 1988, um dos curtidores mais atuantes da região, José Carlos de Castro, participou de alguns cursos em Campina Grande e voltou aplicando seu conhecimento nas suas produções e passando adiante o aprendido, estimulando outros curtidores a aperfeiçoar o processo de beneficiamento do couro.

Foram anos de entendimento, investimento e descobertas até que em 1998 cria-se a ARTEZA - Cooperativa dos Curtidores e Artesãos em Couro de Ribeira de Cabaceiras, reunindo 28 cooperados associados em torno do que viria a ser o grande sustento da população.

 

Como se mantém um processo criativo?

O distrito da Ribeira, localizado a 12 km do centro de Cabaceiras, sedia um dos maiores polos de produção de couro do Brasil, ganhando destaque pela excelência do couro caprino. A Ribeira poderia facilmente ser mencionada como referência de autonomia através do artesanato e do cooperativismo. O distrito, que conta com pouco mais de 5 mil habitantes, não compartilha da realidade de desemprego de boa parte do Brasil. Ao contrário, frequentemente precisa de mão de obra para trabalhos nos curtumes e ateliês.

No centro da Ribeira encontra-se a sede da ARTEZA, com seu centro administrativo e as oficinas de uso em comum dos 75 cooperados. Mais distante do centro, o curtume coletivo, que também é de uso da ARTEZA, conta com visita guiada para que curiosos e turistas entendam todo o processo de beneficiamento do couro caprino. A ARTEZA, que iniciou suas atividades com 28 cooperados homens, atualmente é sede de 75 ateliês que também contam com forte presença feminina, mostrando que a expansão e a cultura do couro propiciam autonomia independentemente de gênero, raça ou classe.

São muitos os processos do trabalho com o couro até que ele se torne um produto a ser comercializado. Caleiro, raspagem, descarne, curtimento vegetal, lavagem, secagem, acabamento, montagem, costura… Toda essa cadeia representa tempo e dedicação, mas também emprego e autonomia. Pensando na constante demanda de mão de obra e na importância da perpetuação de saberes e tradições, Luís um dos organizadores da ARTEZA, destinou um espaço para criação da Oficina de Saberes. Nesse espaço, o ofício do couro é ensinado para crianças da região no contraturno do horário escolar, com apoio e autorização dos pais e a remuneração das produções.

Vale ressaltar que nem todos os ateliês e artesãos fazem parte da cooperativa e que a rede que se forma vai muito além dos 75 cooperados registrados na ARTEZA. Nos processos das feituras, encontramos a diversidade de produtos e criações entre os ateliês, desde peças mais formais e básicas a produtos com mais desenho e traços artesanais marcados. Ateliês, como o de seu Manuel Carlos, onde o processo manual é predominante na criação. Ou industrianatos que seguem linhas de produção e uso de máquinas, com processos bem automatizados.

No distrito da Ribeira, o entendimento do artesanato e do cooperativismo acontece na prática, trazendo para a população o reconhecimento da própria cultura, diluindo o pensamento de escassez e menor valia dos processos artesanais imbuídos pelo sistema capitalista e pelo racismo estrutural do país. Proporciona, assim, a quem se interesse um ponto de vista próspero do semiárido nordestino, onde a escassez de água nada tem a ver com pobreza.