
Cooperativa Art Ilha

As mãos que criam, criam o quê?
Há quase um século, gerações de bordadeiras da Ilha do Ferro se dedicam ao singelo ritual de imprimir no linho branco as formas do bordado boa noite. O nome do ponto faz referência a uma flor local que inspira trabalhos sofisticados. A técnica do bordado quase extinta no Brasil, devido o tempo necessário na produção, consiste em desfiar o tecido e recompô-lo em faixas com motivos florais.(variação).
Entre as peças criadas com as faixas bordadas estão almofadas, toalhas de mesa e de lavabo, jogos americanos, guardanapos, colchas, cortinas, marcadores de livros. Através de uma intervenção do Sebrae, foram criadas três linhas de produtos para cama, mesa e banho: Alagoas do Açúcar – em tons branco, bege e açúcar mascavo com desenhos simétricos e mais clássicos; Alagoas das águas - em branco e lavanda e linhas limpas e suaves; e Alagoas do Folclore - com peças mais coloridas e formas mais lúdicas.
Sempre rigorosamente geométrico e seguindo a trama dos tecidos, o bordado Boa Noite apresenta-se em 4 diferentes composições: Boa Noite Simples, Boa Noite de Flor, Boa Noite Cheio e Boa noite Cheio
Quem cria?
Foto: Tom Alves
Os moradores da Ilha do Ferro descobriram no mergulho criativo uma estratégia para enfrentar desafios sociais comuns das comunidades ribeirinhas do São Francisco. Além do artesanato e da arte popular, os locais vivem da pesca de subsistência e da agricultura.
As mulheres bordadeiras foram organizadas em uma cooperativa com o apoio da Artesol em 1998. Hoje, existem 40 artesãs cadastradas que trabalham individualmente, mas compram o material coletivamente. Uma parte da venda dos produtos é revertida para compra de novos materiais e manutenção da sede.Embora o trabalho seja individual, elas se juntam nas calçadas ou nas casas para bordar, trocar histórias, apoio e impressões do cotidiano.
Onde criam?
Foto: Tom Alves
A Ilha do Ferro é um pequeno vilarejo banhado pelo Rio São Francisco no sertão alagoano. Fica a 18 quilômetros do município de Pão de Açúcar e geralmente é acessado por barco, tendo em vista a precariedade da estrada. O cenário à beira-rio parece ter saído de um filme. Ainda há carros de boi, crianças brincando na rua, lavadeiras lavando suas roupas no São Francisco, artistas entalhando a madeira e as mulheres que bordam sentadas na calçada.
Ao todo, o povoado reúne cerca de 200 famílias que, mesmo à beira de um dos maiores rios do País, enfrentam desafios comuns dos moradores do semiárido: dificuldade para produção de alimentos por questões climáticas, falta de empregos formais, analfabetistmo e dificuldades estruturais como falta de estradas ou saneamento básico. Apesar dessas questões, os moradores viram no mergulho criativo uma forma leve de lidar com as ausências de estrutura e recursos. Além do bordado, o povoado é conhecido por seus artistas populares que tem ganhado notoriedade nacional por conta do rico trabalho de entalhe de galhos de madeira para produção de móveis e esculturas.
Já a tradição de fazer costura, como elas próprias dizem há muito tempo, representa um saber tradicional que é transmitido de geração em geração, de mãe para filha. Algo que faz parte da cultura material da mulher nordestina do Sertão, que expressa valores, condutas e identidades.
Rede nacional do artesanato
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